quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Câncer de pulmão é uma doença da era do tabaco

Equipe Oncoguia
Última atualização: 23/11/2010
por Liciane Mamede do Portal Oncoguia

O câncer de pulmão, depois do câncer de próstata, é aquele de maior incidência entre homens, e um dos que mais vêm crescendo em incidência entre mulheres. Ele é também o tipo de câncer que mais mata em países como Brasil e Estados Unidos, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA) e do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC). A evolução do câncer de pulmão se tornou epidêmica após a disseminação do tabagismo em larga escala a partir da metade do século vinte.

“Nos anos 30, o câncer de pulmão era uma doença raríssima, ele foi crescendo entre os homens e depois entre as mulheres, conforme os hábitos tabagistas foram aumentando”, diz o oncologista Jacques Tabacof, do Centro Paulista de Oncologia. Dados do CDC confirmam a declaração de Tabacof. Com a crescente queda no número de fumantes partir dos anos 80, o número de casos novos de câncer de pulmão também caiu, assim como a mortalidade pela doença.

Além do cigarro, há outros fatores de risco associados ao câncer de pulmão, tais como o contato com determinados agentes tóxicos como asbestos (presente nas caixas d'água e telhas de amianto), radiação, arsênico ou gás mostarda, além de histórico familiar. O cigarro, no entanto, ainda é a causa número um relacionada à incidência deste mal. Segundo o INCA, de 80 a 90% dos casos de câncer de pulmão estão associados tabagismo. Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), essa é uma das principais causas de morte evitável no mundo.

 Sobrevida

 Dentre os tipos de câncer mais recorrentes, o câncer de pulmão é aquele que oferece o pior prognóstico ao paciente. Apesar disso, houve progressos. “A sobrevida mediana de um indivíduo com câncer de pulmão metastático é hoje de 12 meses. Há alguns anos, essa perspectiva era de aproximadamente oito meses, isso significa que tivemos bons avanços”, expõe o oncologista Jacques Tabacof.

O que os médicos consideram um grande avanço, porém, para o paciente está longe de soar reconfortante. “No começo, eu fiquei muito triste e revoltada”, afirma Giselle Senoi, que descobriu um adenocarcinoma inoperável de 4 centímetros no pulmão em 2007. “Mas no fim, você acaba tendo de ser forte para não penalizar os outros”, diz ela, que teve de passar por 16 sessões de quimioterapia e mais 36 de radioterapia.

Embora as perspectivas para esses pacientes estejam melhorando a cada ano com a descoberta de novas drogas e melhor controle dos efeitos colaterais do tratamento, o oncologista Rafael Kaliks, do Hospital Albert Einstein é incisivo ao afirmar: “nenhuma droga jamais irá conseguir ter o mesmo efeito para o indivíduo que o ato de nunca ter fumado, a prevenção ainda é o melhor caminho para poupar sofrimento às pessoas”.

Novos tratamentos

Embora a chance de cura dos pacientes resida principalmente na cirurgia bem realizada, mesmo para pacientes com tumores inoperáveis houve avanços. Eles consistem em melhores técnicas de radioterapia, e melhores tratamentos sistêmicos. Dentre as novas terapias mencionadas pelos doutores Kaliks e Tabacof, estão as chamadas terapias-alvo. Elas consistem em medicamentos que atacam diretamente alguns mecanismos que promovem o crescimento do tumor. Administrados juntamente com quimioterápicos tradicionais, esses medicamentos respondem por uma melhora no prognóstico dos pacientes nos últimos cinco anos.

 “No entanto, para que essas drogas façam efeito, é preciso que o tumor do paciente tenha o alvo para estas drogas, ou seja, o fator específico que o medicamento supostamente deve atacar”, afirma o doutor Rafael. “Infelizmente, menos de 20% dos pacientes possuem esses alvos e aqueles que o possuem são, em sua maioria, não-fumantes, frequentemente do sexo femenino. Há também avanços com drogas sem um alvo específico, como novos quimioterápicos e medicamentos que inibem o crescimento dos vasos que alimentam o tumor, mas com impacto menor que o das terapias-alvo”, completa ele.

Dentre as terapias-alvo, os medicamentos inibidores do efeito pró-crescimento do Fator Epidermal de Crescimento (EGFR), Erlotinib e Gefitinibe, têm obtido destaque. Eles são usados para tratar pacientes com tumores chamados de não-pequenas células, do subtipo não-escamoso (ver quadro abaixo), e que tenham uma determinada mutação. Lamentavelmente, apenas uma minoria, entre 10 e 12%, dos pacientes de câncer de pulmão são positivos para a mutação do EGFR, que confere eficácia a estas terapias-alvo. Um segundo tipo de mutação, que envolve um gene denominado ALK, provoca uma ensibilidade significativa do tumor ao tratamento com Crizotinibe, uma medicação ainda não disponível comercialmente. Porém, tal mutação é ainda mais rara.

“Embora a quantidade de pacientes beneficiada por esses avanços ainda seja pequena, ele representa muito. Devemos ter em mente que a cura do câncer em geral não vai acontecer, o que acontecerá no futuro é a descoberta de medicamentos cada vez mais eficientes para um determinado subtipo de cancer, quem sabe transformando este subtipo em uma doença crônica”, diz Jacques Tabacof.

“No futuro, esperamos que os diagnósticos possam ser muito mais precisos. Novas medicações, alvejando muitos outros alvos, serão descobertas de forma a permitir um tratamento eficiente para um número maior de pacientes. Se conseguirmos em 15 anos aumentar a sobrevida dos indivíduos que têm câncer de pulmão em 30 ou 40%, isso será um avanço monumental”, completa Rafael Kaliks.

 Para exemplificar o potencial das terapias-alvo, Kaliks cita o exemplo da leucemia mieloide crônica, um tipo de câncer para o qual foi desenvolvida uma terapia-alvo responsável por transformá-la, hoje, em uma doença crônica na maioria dos casos. “Provavelmente, o paciente não será curado, mas ele poderá viver sua vida inteira com essa doença, apenas controlando-a com medicamentos”. Ele alerta, entretanto, que a medicina ainda está muito longe de atingir esse patamar para o câncer de pulmão.

Seleção dos pacientes para a cirurgia

 Outro avanço apontado pelos especialistas como significativo foi a melhora das técnicas de seleção dos pacientes que devem ou não ir para cirurgia. Em tese, apenas nódulos de até quatro centímetros são operáveis, mas isso não é uma regra, pois outros fatores além do tamanho do tumor também devem ser considerados. 

“Quando há um comprometimento maior dos linfonodos do mediastino (região central entre os pulmões), o paciente dificilmente se beneficiará de uma cirurgia. Neste caso, geralmente, é utilizada a radioterapia como tratamento primário. A quimioterapia também é aplicada com o intuito de tornar o tumor mais sensível à radioterapia”, afirma Rafael Kaliks. “Essa melhor seleção acaba poupando o paciente de uma cirurgia que não teria sido curativa de qualquer jeito”, completa ele.

O PET scan, ou Positron Emission Tomography, é o exame que permite ao médico visualizar se há linfonodos com suspeita de invasão pelas células cancerígenas e identificar se já há metastases à distância (em outros orgãos). “Geralmente, a regra é que, se após o PET scan e a ressonância de crânio, não for identificada nenhuma metástase, o procedimento cirúrgico com intuito curativo será realizado”, afirma doutor Jacques.

“Uma melhor seleção do paciente se reflete em sua qualidade de vida, porque acaba poupando-o de grandes cirurgias desnecessárias e que poderiam, na verdade, piorar seu prognóstico”, completa Kaliks. 

 Tipos de Câncer de Pulmão
 
1) Pequenas células: respondem por 15% de total de casos. Tem como característica uma melhor resposta ao tratamento inicialmente, mas as chances de recidiva são maiores. Incide quase que exclusivamente em fumantes.

2) Não-pequenas células: representam 85% do total de casos. O câncer de não-pequenas células pode ainda se dividir em:

a) Adenocarcinoma: tipo mais comum em mulheres e não-fumantes, embora a maioria ocorra em fumantes. A maioria dos casos com mutações que conferem um alvo terapêutico para novas drogas é deste tipo.

b) Carcinoma epidermoide: é mais comum entre homens e seu aparecimento está relacionado a um histórico de tabagismo. Por responder mal ao tratamento quimioterápico e radioterápico, acaba tendo um prognóstico pior.

c) Carcinoma de grandes células: mais raro, tende a ter rápida metástase.

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